Uma das interpretações mais comuns é a de que a responsabilidade social corporativa (RSC) pode ser considerada um mecanismo através do qual empresas engajam em ações que pretendem criar algum bem estar social, normalmente indo além de seus interesses convencionais de negócio. Na maior parte das vezes, RSC é parecida com filantropia, e os dólares preenchem lacunas críticas no desenvolvimento de áreas chave como acesso à alimentação, educação, saúde, etc. A contribuição de corporações, dessa forma, é sempre muito bem-vinda. No entanto, será que essas normalmente disconexas intervenções de RSC conseguem criar um impacto duradouro ou resolver problemas de forma sustentável? Será que entregam mudanças sistêmicas e abrangentes em direção à resolução de problemas, como tapar um furo em um dique? A resposta para estas perguntas, infelizmente, é “não”.
Realizar um impacto duradouro ou trazer mudanças sistêmicas requer uma mudança de perspectiva – em vez de resolver questões de desenvolvimento, contribuir mais para o planejamento do desenvolvimento. Hoje, bilhões são gastos em áreas como moradia, saneamento, benefícios agrícolas, etc. Mas a maior parte destes gastos não é guiado por dados adequados e, consequentemente, fica aquém dos resultados esperados. A disponbilidade limitada ou a total ausência de dados confiáveis faz com que todo o planejamento de desenvolvimento e o exercício de gastos ineficazes, uma vez que as regiões com maiores dificuldades não recebem a alocação orçamentária que necessitam.
QUAL É O PODER DA INFORMAÇÃO?
Vivemos em uma época marcada pela interconexão. Informações são criadas e consumidas em uma velocidade sem precendentes. Com o auxílio dos computadores, somos capazes de ligar pontos que desenham um cenário muito maior. De fato, informações que estão disponíveis livremente em domínios públicos já são acessadas todos os dias para direcionar uma grande variedade de causas. O Google Trends é capaz de buscar informações sobre vacinas de gripe para prever uma epidemia e o Twitter é capaz de revelar informações sobre acontecimentos em tempo real. Por exemplo, a ONU utiliza dados do Twitter para entender quais tópicos de desenvolvimento estão sendo mais falados em diferentes regiões, ou mesmo para identificar pontos de interesse ou de inquietação social.
Para onde vamos a partir daqui esta limitado apenas pela quantidade de informações que conseguimos acessar.
COMO AS CORPORAÇÕES PODEM AJUDAR?
Corporações são poderosas ferramentas na geração de dados críticos. Estão constantemente envolvidas com os consumidores e lares para comercializar os seus produtos e serviços, e, por sua vez, reúnem grandes quantidades de informações de nicho valiosas, que ditam os desafios da cadeia de abastecimento, padrões de consumo, gargalos logísticos, etc. Estes dados podem ser imensamente poderosos, se reunidos para um banco de dados consolidados e analisados de forma eficaz.
Por exemplo, dados de comunicação móvel, com discernimentos reveladores sobre padrões de mobilidade da população, podem ser utilizados para criar um planejamento de rede eficaz para transporte e moradia (isto já está sendo feito na Etiópia). Vendas de bens de consumo rápido, dados de vendas no varejo de alimentos frescos e padrão de consumo de alimentos podem ser usados para simplificar a cadeia de valor da agricultura, tornando as decisões sobre a colheita mais de acordo com a demanda do mercado e menos como a abordagem atual, centralizada apenas na oferta.
A FILANTROPIA DE DADOS PODE VERDADEIRAMENTE SER UMA GRANDE CONTRIBUIÇÃO DE CIDADANIA CORPORATIVA
Quando a informação sai da esfera privada para um banco de dados focado em um bem maior, ela pode ser analisada utilizando técnicas de big data para criar estratégias de planejamento para o desenvolvimento. Em outras palavras, filantropia de dados pode ser uma forma extremamente efetiva de responsabilidade social.
Possíveis desafios:
Esta é uma ideia inovadora, mas que está alinhada com os nossos tempos atuais. Assim como medidas são tomadas para incentivar a filantropia corporativa, medidas para incentivar a filantropia de dados certamente estão a caminho.
Além disso, será importante prever algumas barreiras para o compartilhamento de dados, e encontrar soluções antecipadamente. Uma possível razão poderia ser a competitividade e confidencialidade dos dados, mas existem vários modelos pelos quais essas preocupações podem ser resolvidas; (a) A análise dos dados por uma equipe in-house para desenvolver idéias e trabalhar em estreita colaboração com as agências governamentais (b) A institucionalização de um conselho de dados onde os dados são agrupados em conjunto, e armazenados em anonimato. Pode ser executado por agências certificadas sem fins lucrativos (c) Compartilhando dados derivados não confidenciais ao abrigo de acordo de não divulgação com o governo. Outra forma viável é a institucionalização de troca de informações de RSC, que podem funcionar de forma parecida com os sistemas de créditos de carbono, para incentivar a participação de outras corporações.
Retornando ao ponto inicial – o impacto que o desenvolvimento a partir de dados focados pode criar pode ser muito extenso. O mundo de um pequeno agricultor pode mudar pelo valor acrescentado resultante das decisões de cultivo guiadas por dados, o governo e as entidades locais podem planejar melhor a infra-estrutura da cidade e alocar capital, e os dados permitirão que os prestadores públicos e privados de saúde prevejam melhor e rastreiem epidemias de forma mais efetiva. As possibilidades são realmente infinitas.
Por Nisha Dutt, Consultora-Chefe Global e Diretora Executiva na Intellecap, uma empresa de consultoria especializada em estudos sobre a Base da Pirâmide.
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